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COLUNISTAS

Quando a Infância Vira Espetáculo: Lições do Caso Hytalo Santos

26/08/2025 12h22 | Atualizada em 26/08/2025 12h26 | Por: Acorsi & Botega
Foto: @hytalosantos/Instagram

O recente caso envolvendo o influenciador Hytalo Santos, exposto em denúncia do youtuber Felca, trouxe ao centro do debate público a adultização de crianças e adolescentes, termo que descreve a exposição precoce a contextos e comportamentos próprios da vida adulta, frequentemente com conotação sexual. A suspeita de que menores de idade estariam sendo instrumentalizados como entretenimento para adultos — em festas com álcool, danças sensuais e exposição de situações médicas delicadas — levou à atuação do Ministério Público e da Justiça, com medidas como a suspensão de perfis e a desmonetização de conteúdo. Este episódio, no entanto, transcende o caso individual e nos convida à uma reflexão sobre a responsabilidade jurídica em cadeia.

Do ponto de vista jurídico, a responsabilidade não se limita a quem produz o conteúdo. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA - Lei nº 8.069/90) é rigoroso ao criminalizar toda a cadeia de divulgação. O artigo 240 do ECA tipifica o crime de produzir ou registrar, por qualquer meio, cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente, enquanto os artigos 241-A e 241-B punem quem oferece, transmite ou publica tal material. Assim, quem compartilha ou viraliza o conteúdo também comete crime, mesmo sem ser o autor original. A jurisprudência confirma que a simples posse ou o compartilhamento são suficientes para a configuração do delito, visando proteger a dignidade sexual dos menores de forma integral.

Muitas pessoas pensam: "Eu só recebi e passei adiante" ou "Estava apenas no grupo, nem abri". Cuidado. Para a lei brasileira, isso não é uma desculpa. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) é muito claro: não apenas quem produz, mas também quem oferece, troca, transmite, publica ou divulga conteúdo de exploração sexual infantil está cometendo um crime.

Outro ponto crucial é a responsabilidade dos pais ou responsáveis legais. O artigo 249 do ECA prevê multa para quem descumpre os deveres inerentes ao poder familiar, como o de proteção, e, em casos graves, a negligência pode levar à perda do poder familiar, conforme o artigo 1.638 do Código Civil. A alegação de que os adolescentes eram emancipados não afasta a ilicitude, pois a emancipação antecipa a capacidade para atos da vida civil, mas não autoriza a violação de direitos fundamentais. A proteção à dignidade e ao desenvolvimento saudável prevalece sobre a capacidade civil.

As plataformas digitais que hospedam e monetizam esses conteúdos também estão na mira da Justiça. O Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/14), em seu artigo 21, estabelece que o provedor pode ser responsabilizado civilmente se, após ordem judicial, não tornar o conteúdo indisponível. A jurisprudência tem evoluído para reconhecer o dever de cuidado das plataformas, a exemplo de decisões como a da Apelação Cível 1002119-29.2021.8.26.0453 do TJ-SP, que reforça a obrigação de agir para coibir a disseminação de conteúdo ilícito, sob pena de responsabilização por omissão.

O caso Hytalo Santos é um sintoma de um problema maior: a transformação da infância em produto na economia da atenção. A legislação brasileira, fundamentada no princípio da proteção integral (art. 227 da Constituição Federal), oferece ferramentas robustas para combater a adultização. Contudo, sua eficácia depende da conscientização de que a responsabilidade é compartilhada. Punir apenas o criador do conteúdo é insuficiente. É preciso que a sociedade — incluindo quem consome, compartilha e se omite — compreenda seu papel na perpetuação desse ciclo de violações. Proteger a infância é garantir que ela seja vivida em sua plenitude, e não transformada em espetáculo.

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